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As forças do crescimento e o desafio dos meios

Recentemente, assisti a uma palestra sobre liderança e crescimento que me deixou pensativo. As ideias apresentadas eram instigantes, mas despertaram em mim uma reflexão sobre o equilíbrio entre resultados e o caminho que escolhemos para alcançá-los.


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Recentemente participei de uma palestra cujo tema era “Liderança para inovação e estratégias para crescimento empresarial”. Fui movido pela curiosidade genuína — afinal, são palavras que orbitam o universo da gestão de conflitos: liderança, inovação, estratégia, crescimento. Termos que costumo associar à construção de ambientes saudáveis, à mediação de diferenças e à capacidade de encontrar sentido coletivo no trabalho.


A palestra apresentava o que o expositor chamou de “as cinco forças do crescimento”: visão, performance, escala, comunidade e ecossistema. O conteúdo, à primeira vista, parecia coerente e inspirador. Mas conforme o discurso avançava, algo dentro de mim começou a se inquietar. Não pela proposta em si, mas pelo tom com que cada força era apresentada.


A visão, dizia ele, deve ser maior que sua capacidade orçamentária. Uma ideia provocativa — sonhar grande sempre move. Mas me perguntei se não é justamente esse tipo de visão ilimitada que faz tantas empresas desmoronarem ainda nos primeiros anos. Há uma linha tênue entre ambição e desatino. Quando a visão se desconecta do planejamento, ela deixa de inspirar e passa a cegar.


Depois veio a performance. “O que importa é o desempenho, não o empenho”, repetiu ele com ênfase. Fiquei pensando: se só o desempenho importa, o que fazemos com o fator humano? Onde ficam o esforço, a cooperação, o aprendizado? A competição, quando levada ao extremo, é o combustível do litígio. É ela que transforma parceiros em adversários, que ensina as pessoas a medir o próprio valor pela derrota do outro. É possível gerar desempenho sem sobrepor, sem humilhar, sem desgastar — mas isso exige maturidade emocional e um olhar mais amplo sobre o que é “ganhar”.


A terceira força era a escala. Ampliar canais, multiplicar ofertas, diversificar presença. Tudo parece lógico, mas há um perigo sutil: crescer sem estar pronto para crescer. É um erro comum — expandir demais e dispersar energia antes que a estrutura esteja firme o suficiente para sustentar o próprio peso. Em alguns casos, o melhor passo em direção ao crescimento é parar e consolidar o que já se tem. Crescer não é apenas multiplicar resultados; é amadurecer o processo.


Quando falou sobre comunidade, confesso que senti um certo desalento. A ideia apresentada era cativar um grupo seleto de pessoas para, em seguida, poder cobrar mais caro por isso. Um modelo que pode funcionar no curto prazo, mas que esvazia o sentido do que é, de fato, uma comunidade. Porque comunidade, na essência, é pertencimento. É o espaço onde cada um encontra voz, onde o valor é compartilhado e não condicionado. Quando transformamos a confiança em estratégia de preço, perdemos a alma da relação.


Por fim, a quinta força: o ecossistema. A proposta era criar parcerias para ampliar a oferta e viabilizar oportunidades. Em teoria, uma ideia sólida. Mas novamente percebi que se tratava de um ecossistema visto apenas como meio de vantagem — não como um organismo vivo, onde cada parte contribui e se alimenta das outras. No sentido profundo, um ecossistema é um acordo tácito de sustentação mútua. É a consciência de que, se um elemento colapsa, o conjunto inteiro adoece. Quando enxergamos o outro apenas como instrumento de crescimento, o ecossistema vira mercado — e mercado, por si só, não garante saúde.


No final da palestra, a frase que mais ecoou foi: “O que importa é o resultado — o resto é mimimi.” E foi nesse ponto que o desconforto se instalou de vez. Porque, de fato, resultados são importantes. Eles validam o esforço, mostram direção, traduzem em números o que antes era apenas intenção. Mas quando o resultado se torna o fim em si mesmo, os meios perdem sentido. E sem sentido, até o maior dos crescimentos se torna vazio.


Saí da palestra pensando nas vezes em que vi organizações ruírem não por falta de visão, mas por falta de escuta. Equipes adoecerem não por falta de metas, mas por excesso de cobrança. Projetos promissores se perderem porque a pressa por “escalar” superou a capacidade de amadurecer. Às vezes, o verdadeiro desafio não é crescer — é sustentar o crescimento sem se perder no processo.


Não deixei o evento com a sensação de que o palestrante estava errado. Pelo contrário, reconheço o mérito de quem construiu uma história de sucesso e compartilha o que aprendeu. Mas percebi que falávamos de mundos diferentes: um onde o resultado é o destino, e outro onde ele é consequência.


No meu trabalho com gestão de conflitos, aprendi que resultado sem relação é instável. Que números sem vínculo humano são frágeis. Que ecossistemas verdadeiros se formam quando há confiança, e não apenas quando há contrato. E que o sucesso que ignora o fator humano é sucesso de curta duração.


Talvez estejamos vivendo um tempo de transição silenciosa. Um tempo em que os velhos modelos ainda são aplaudidos, mas já não inspiram como antes. Um tempo em que novas gerações buscam mais experiências do que acúmulo, mais pertencimento do que prestígio, mais sentido do que sucesso.


E é por isso que, mesmo admirando quem cresce, sigo acreditando que o desafio não é o tamanho do resultado, mas a integridade dos meios. Porque o futuro, cedo ou tarde, pertencerá a quem conseguir crescer sem romper — e a quem entender que a verdadeira força de um ecossistema não está em quem vence, mas em quem sustenta.

 
 
 

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